Quando telona e telinha colidem: Feud

Primeira Fila segunda-feira, 20 de março de 2017

Em um dos muitos textos em que relembrei de forma nostálgica alguns filmes que marcaram minha vida, destaquei What Ever Happened to Baby Jane, protagonizado pelas divas Joan Crawford e Bette Davis, como um dos favoritos. O thriller marca a relação de dependência, rivalidade, ressentimento e violência entre duas irmãs. Enquanto Crawford dá vida à doce e desprotegida Blanche, que teve a carreira interrompida por um acidente que a deixou paraplégica, Davis é a afrontosa Baby Jane Hudson, prodígio infantil que, com o tempo, ficou esquecida e caiu no ostracismo.

O fruto não cai muito longe da árvore e a relação entre Joan e Bette era tão tóxica quanto a das personagens. No passado, haviam disputado capas de revista, papeis, homens e, no set do longa, quem se destacaria mais. Se agrediram física e psicologicamente ao longo das gravações e eternizaram a inimizade como uma das mais emblemáticas de Hollywood. Com essa premissa, Ryan Murphy lança mais uma série de sucesso, Feud, destrinchando o embate de décadas entre as duas lendas.

Felizes como eu nas festas de família.

Jessica Lange assume o papel de uma Joan Crawford já decadente e deprimida após a morte do marido, enquanto Susan Sarandon explora a personalidade vibrante e debochada de Bette Davis, conhecida por seus grandes olhos e aparência exótica. Destaco também as ótimas participações de Stanley Tucci, como um dos fundadores da Warner Bros., e Alfred Molina como Robert Aldrich, diretor do filme, que testemunhou de camarote a incessante batalha de egos entre as atrizes.

A produção prova, mais uma vez, que Ryan Murphy é capaz de oferecer boas histórias e entretenimento de qualidade (Afinal, ele foi campeão de estatuetas no Emmy por ACS: The People vs. O.J. Simpson), apesar de se esforçar para tentar provar o contrário com American Horror Story. Feud é divertida e leve, mas toca nos pontos mais delicados das carreiras de Joan e Bette, transformando a antipatia gratuita entre duas mulheres que tinham tudo para ser amigas em algo crível. Eram tempos difíceis para profissionais mulheres e mais velhas, mesmo as que dominaram o cenário hollywoodiano por tanto tempo, e What Ever Happened to Baby Jane? , de certa forma, foi uma tábua de salvação para as duas que, curiosamente, tinham o costume de puxar o tapete uma da outra.

A escolha do elenco combinou com os perfis das atrizes. Ainda que Jessica Lange seja sempre Jessica Lange, mocinha ou bandida, aonde quer que vá, ela tem um refinamento e uma postura muito próximas às de Crawford, que sempre aliou a carreira às suas andanças na alta sociedade. Por outro lado, Susan Sarandon, como sua personagem, é a mais talentosa da dupla e, apesar de pouco parecer fisicamente com Davis, em cena não há quem ouse dizer que aquela mulher não interpreta a melhor Bette Davis que já viu na vida. Ambas, simplesmente, maravilhosas. Aliás, é tudo maravilhoso. É preciso destacar o ótimo trabalho de pesquisa, maquiagem, cenografia, som, direção e roteiro. Feud não funcionaria sem uma equipe afiada e talentosa, capaz de transformar uma história prescrita pelo tempo em algo moderno e de interesse público.

Apesar de ter como objetivo mostrar os bastidores e focar nas atrizes e não no filme em si, sendo este apenas um pano de fundo para o ápice da relação bizarra que mantinham, a produção recriou algumas cenas antológicas, o que deixou um gostinho agridoce de remake no ar. No céu, inferno, ou virando adubo no cemitério, garanto que Joan Crawford e Bette Davis estão se mordendo de inveja das duas, querendo esganá-las e voltar das trevas para interpretarem a si mesmas juntinhas aplaudindo o espetáculo de suas vidas. Para fãs das telonas e das telinhas, Feud – que já está em seu terceiro episódio – é imperdível.

Claramente o maior brotp da história do cinema.

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