Vista-se para mim

baconfrito terça-feira, 07 de julho de 2015

O Bacon é um site de entretenimento, e ainda que foque em meia dúzia dos principais pontos da área, faz parte de escrever pra cá abordar coisas que acabam saindo dessa zona, ou ainda que se fundem com outras, mas sem abandonar suas “raízes”. Isso é uma forma requintada de dizer que, eventualmente, saímos do padrão estabelecido por nós mesmos para abordar questões que queremos abordar, e inventamos uma desculpa qualquer pra encaixar aqui.

O tema de hoje é nudez. É, é isso aí. Não tenho a mínima pretensão de abordar os diversos e requintados lados de um tema que sempre gera discussão, mas apenas apontar uma coisa cada vez mais óbvia, isso num espaço pequeno de tempo, porque eu tenho que acordar cedo amanhã. Diferentemente do que é comum para nós, o objetivo aqui não é gerar debate, é apenas expor uma questão que você já deve ter notado, e se não notou deveria se envergonhar disso.

Nudez é entretenimento.

 Sempre muito difícil achar pornografia que não mostre nada.

Você pode me dizer que bem, isso é óbvio pra caralho (Sem trocadilho), e como eu disse no segundo parágrafo, sim, é mesmo, mas a verdade verdadeira é que eu não estou me referindo à pornografia. Pornografia é, claro, sobre nudez, ainda que seja cada vez mais comum outras formas de estímulo sexual na indústria, mas também é um tema amplo, que vai além da simplicidade da nudez, da ausência de roupas e coberturas.

Estou me referindo ao resto, todo o resto.

Outro dia estava sei lá onde e peguei um trecho de um episódio da novela das 11 da Globo, Verdades Secretas. Não sei a história, mas sei que a tia Globo está adorando poder fazer uma novela com menos restrições por causa do horário. O episódio em questão teve o Rodrigo Lombardi fazendo sexo com sei lá quem, de forma relativamente explícita pra TV, coisa de deixar o Cine Privê e seus semelhantes no chinelo.

Ainda que recentemente tenha deixado de ser notícia, o FEMEN continua fazendo protestos do mesmo jeito que sempre fez: Com as integrantes nuas, com frases de protesto pintadas nos corpos, entrando em “combate” com a polícia e, eventualmente, sendo presas por atentado ao pudor, algo que só serve para reforçar a ineficiência dos sistemas penal e jurídico dentro e (Principalmente) fora do Brasil (Para a desgraça dos detratores nacionais).

Ontem, a artista suíça Milo Moiré foi presa por causa de uma perfomance (Tirar selfies em frente a torre Eiffel) em Paris: Assim como muito de sua obra, esta também se baseia na nudez da artista em prol de sua arte. Após uma noite na cadeia ela foi liberada, mas deve ir para audiência jurídica, já que a França não é tão relaxada quanto a Suíça. Não é a primeira vez que um processo semelhante se repete, e provavelmente não será a última.

De novo, não vou entrar nos méritos políticos, econômicos e sociais de nenhuma dessas coisas: Cada um deles dá pano pra manga até não poder mais, e eu tenho oito minutos pra terminar isto aqui e estar na cama.

 Só pra achar esta foto já estourei meu prazo em vinte minutos.

O que acontece é que cada um desses exemplos se baseia em coisas completamente diferentes entre si: Arte, ativismo político, busca por audiência. A lista continua e é facilmente personalizável, mas acaba juntando tanto “bons motivos” quanto motivos cínicos, que visam claramente o lucro que a visibilidade trará, e isso faz com que todos sejam colocados no mesmo saco.

Como já diria aquele seu tio que tá pra bater as botas, o xis da questão é que nudez não é mais um tabu. Já pensou nisso? Não que você não se impressione ao ver alguém sem roupa no Teatro Municipal de São Paulo, por exemplo, mas é por ser incomum, não porque a falta de roupa te agride. A pornografia tem um papel importante nisso, mas a real é que já há vários anos a nudez tem deixado de ser importante, num processo parecido com o que acontece com outros tabus, como por exemplo as tatuagens, a homossexualidade e o sexo como um todo. Quebra de tabus é um processo sem volta, que vem crescendo e deve crescer ainda mais nas próximas décadas.

Isso, como tudo nesta vida, tem pontos negativos e positivos: Claro que é bom poder abordar questões sem medo de ter uma retaliação, e isso é ainda maior quando se trata de questões do “ser” e não de opiniões e posicionamentos sociais, mas a liberdade leva à falta de tato. Ou, sem usar de eufemismos, quando se pode abordar um assunto qualquer, sem restrição alguma, é apenas uma questão de tempo até a aura de misticidade e hesitação ao redor dela ser rompida: Algo que pode ser debatido não é sagrado, logo, está sujeito a tudo que se pode pensar.

Um tabu quebrado é uma proposta mercenária esperando pra acontecer.

Aquela frase de Nieteche sobre matar Deus

O que nos leva de volta à nudez. A nudez já foi um tabu e você vai se espantar de ver pessoas sem roupa dependendo do local onde estiver, mas fora disso, já foi, acabou. Não quer dizer que você vá gostar de ter seu filho exposto ao pênis de algum artista qualquer (E eu juro que esta frase não é uma apologia à pedofilia) ou que terá uma cena de sexo mais explícita às seis da tarde na TV, mas sim que quando houver a nudez, seja onde for, sobre o pretexto que for, o choque será pela situação incomum e não pelo objeto à frente. Sim, objeto: Outro assunto extenso que fica pra outra hora.

E sendo a nudez um tabu desvirginado, esta é uma meretriz.

E como qualquer meretriz, a nudez trabalha pelo entretenimento de seus clientes e frequentadores, do público pagante e do público que se vê envolvido por acidente ou por descuido, e o objetivo é o lucro (E este na maioria das vezes não é financeiro – aliás, é comumente emocional). Sendo assim, era novamente questão de tempo até que a nudez fosse usada para os mais diversos objetivos, alguns mais sinceros, outros nem tanto, e ainda uma parte que realmente acredita na nudez como forma de expressão, e que como toda forma de expressão, pode expressar qualquer coisa.

O problema da expressão, entretanto, é inerente (E valiosíssimo): O juiz é o público, não aquele que se expressa.

Como todos, hora ou outra, somos público, e nos resta então uma escolha, que é a mesma escolha de tantas outras questões, e que há tanto tempo exerce um papel central nas indagações existenciais do ser humano: Devemos abraçar o que nos é real, o que sentimos, pensamos e desejamos, ou devemos nos abster de algumas delas, visando um “bem maior”, seja para nós mesmos, individualmente, ou para nossa família, amigos, sociedade, nação e (A cada dia mais) globalidade? De forma menos chique e com menos vírgulas, abraçamos a nudez como forma de expressão ou a negamos, mantendo um falso (E empoeirado) lençol branco sobre ela, fingindo que ainda achamos a nudez um tabu (E, portanto, passível de punição)?

 A cruz é proposital, ainda que mais como bode expiatório.

O legal dessa pergunta é que ela já foi respondida. Nós já a respondemos.

Podemos negar o quanto for, mas a verdade é que a nudez (E vários outros tabus) já são parte do nosso bordel, e já utilizamos seus serviços para nossos lucros pessoais. Lá no começo dei três exemplos, da novela, do ativismo e da arte, e fiz a escolha proposital de não deixar nenhum link ou imagem de nenhum deles: Se você abrir outra página aí e pesquisar por qualquer um deles, encontrará fácil resultados para todos eles. Resultados estes, em sua gigantesca maioria, sem nenhuma censura da nudez que carregam (Uma mudança que ocorreu nos últimos anos, de forma impressionantemente rápida). Claro, haverá exceções, mas aí entra aquela velha questão: Com ou sem o tipo de censura que for (A simples tarja preta está em decadência há anos), a matéria, a notícia, o serviço ainda está lá. Borrado, mas lá, em letras garrafais e amigáveis… Isso pra não dizer quando, na própria matéria censurada, não há um link para a matéria sem a censura.

Fazemos o que aprendemos a fazer há tanto tempo: Jogar dos dois lados. Cobrimos os móveis com lençóis, para quando for conveniente levantar uma ponta e espiar por baixo… Como uma saia.

E assim levamos a grande questão deste texto: A nudez é entretenimento porque deixou de ser assunto intocado, e portanto abriu as pernas (De forma totalmente não romântica mesmo) à qualquer um que, por pouco tempo que fosse, pudesse provar o gosto da recém adquirida liberdade, e não há porque negar, é doce. Mas a liberdade não só vem com o preço de se sujeitar a quem e o que for, como também vem com a condição que o gosto se deve ser sentido somente quando todo mundo estiver fingindo que não está olhando, para não escandalizar nosso pudor não da nudez, mas da hipocrisia em aceitar que frequentamos este tipo de estabelecimento.

Seja qual for a desculpa que dermos, pelo pretexto que definirmos, e pelas condições que impusermos, não podemos fazer nada quanto à grande realidade do que temos bem na nossa frente: Corpos nus, e que gostamos deles assim pela luxúria, gula e avareza.

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