Oração para o Grande Público

Televisão segunda-feira, 15 de junho de 2015

Pai IBOPE Nosso que Estais no Céu
O Senhor é Convosco
Bendito sois Vós entre a audiência
Venha à nós a Vossa Estatística
Seja feita a Vossa Tendência
Assim na Novela como no Auditório
Santo Apresentador Filho de Deus
Explicai a Nós Os Convidados
Agora a Regra Da Prova Da Casa Própria
Perdoai Nosso Português Assim Como Perdoamos Vossas Interrupções
Glória À CG, AO Celta E AO Curso DE Inglês
Assim Como Era Em Preto E Branco E À Cores
NãO NoS DeixeiS CaiR NO EmpréstimO ConsignadO
E LiVrAI-NoS De ToDa pALhA dE AÇo
AMÉM

Cê já parou pra pensar como seriam os programas de TV sem gente disposta a participar deles?

Quero dizer, propagandas são uma coisa, afinal a emissora precisa ganhar dinheiro, e sendo uma mídia com bons 88 anos (Sim, é isso mesmo) e cujas origens datam da metade do século 19, nada mais justo que utilizar o método comum: Aliar sua transmissão “comum” com inserções de produtos e serviços: O primeiro grande método que deu certo. Em palavras mais sinceras e óbvias, a TV se mantém num sistema comercial antigo pra caralho, que começou antes mesmo do rádio (Bem antes mesmo), e que, nas duas últimas décadas, vêm tentando funcionar na internet (E, a cada ano, falhando mais miseravelmente ainda).

A bem da verdade, propagandas nem sempre são coisas ruins: Basta uma rápida pesquisada para achar propagandas realmente incríveis, isso pra não falar das propagandas que nós realmente lembramos porque, de um jeito ou de outro, nos marcaram ui. O fato de expor seu produto ao seu público alvo não é um problema, o problema mesmo é que ele não funciona mais, ao menos do modo que é praticado.

 Ahh, MSN

Tenho certeza que você já teve a infelicidade de assistir um programa do Faustão em que este não tinha assunto o suficiente, o que levava (E provavelmente ainda leva – faz anos que não assisto) à “entrevistas” chatíssimas e longuíssimas, pra preencher tempo. Também sei que você já viu algum dos muitos programas do Silvio Santos em que cada frase dita pelo velho é ovacionada pela plateia totalmente feminina (Não é preconceito, é só a verdade) do programa, numa mistura de cobiça e luxúria. E também tenho certeza que você já assistiu o Rodrigo Faro juntando casais recém apaixonados (Ou não, se você for magrelo, narigudo e tiver uma voz esquisita) para alegria da nação. E o Ratinho, a Chris Flores, o Leão, o João Kleber, Emílio Surita, Eliana (Oh, a decepção, meus amigos), Hebe, Christina Rocha, Huck, Gugu, Serginho Groisman, Celso Portiolli, Galisteu, André Marques (Relembrar é viver) e tantos outros.

Mas não quero saber da moral, dos esquemas, dos número e nem nada disso. Não, a pergunta tá alí em cima e vou repetí-la: O que seria dos programas de TV sem gente para participar deles? Me refiro à essa gente (Sim, sou elitista) que topa gravar quadros sobre a prima que morreu num tiroteio e agora quer “justiça”. Essa gente que dá entrevista depois de enchente, que participa das pegadinhas (Todas ainda mais falsas que luta livre), que dá opinião sobre o BBB ou a Fazenda, que se mata na plateia pra pegar o kit de tintura pro cabelo, que topa ir pros bastidores ganhar uma “transformação” no visual, e que passa quarenta minutos respondendo as mesmas perguntas sobre a mãe que não vê há trinta anos e chora, surpresa, ao ver a véia aparecer no final. Essa gente.

Tire quatro segundos da sua vida pra pensar em como a TV seria sem essa gente.

A primeira diferença é que esses programas todos teriam uma audiência baixíssima comparada com a que têm, uma vez que a identificação do público com o que lhe é apresentado é importante, e isso significa que a quantidade de programas do tipo diminuiriam. A segunda diferença entretanto ficaria dividida: Parte (Provavelmente a maior parte) teria as mesmas matérias sobre os mesmos assuntos, tudo muito raso, pra poder reaproveitar o tópico na semana seguinte; e parte seria de uma qualidade infinitamente melhor porque nego teria que se esforçar pra achar assunto pro próximo programa, e depois de um tempo isso requer esforço de verdade. E a última grande diferença é que a pouca (E falsa) interação do público com a TV, seria praticamente extinta: A televisão seria quase que totalmente uma mídia expositiva (O que já é, mas tenta remediar), o que significa que a quantidade de informações apresentadas seria maior.

De forma simplificada, a TV teria muito mais uma cara Discovery Channel que MTV: A oferta seria maior, mas com a identificação e a interação reduzidas, os programas teriam que se adaptar para oferecer conteúdo o tempo todo, ao invés de contar com tantos e tantos minutos por programa gastos em chamadas telefônicas, VTs (De videotape, pra quem não sabe), entrevistas, pegadinhas e programas sobre jogos pra ganhar alguma coisa PREIXTEISHON PREIXTEISHON PREIXTEISHahhhh um jogo da viidaaa. Isso levaria à uma participação diminuída de pessoas “de fora da TV” na mesma: Provavelmente políticos, famosos que querem divulgar algum trabalho (Mas nada de subcelebridades), algum eventual pronunciamento de pessoas ligadas à empresas (Num recall, por exemplo). Em suma, quem participaria da TV ou compraria seu espaço lá, pagando extremamente caro para isso, ou pessoas que seriam convidadas à participar de programas específicos e, muitas vezes, de nicho, numa troca de visibilidade entre a pessoa e o artista (Parecido com o que realmente acontece, mas de forma muito mais peneirada e subdividida).

A televisão seria elitista, não por definir padrões de beleza, gerar moda ou popularizar produtos, mas sim porque sua programação seria totalmente voltada para um público reduzido. Algo que, segundo os exemplos que temos na vida real, não é sustentável e, portanto, não dura.

 Assim como os seus relacionamentos.

O que eu quero dizer com tudo isso? Que, no cenário atual e do modo que a história se desenvolveu através dos anos, há algumas coisas que, para existirem (E continuar existindo) precisam ser ruins. Isso não quer dizer que se alguém voltasse no tempo e mudasse as paradas lá atrás não poderia ser diferentes e funcionar bem, mas que de acordo com a realidade, ou é do jeito que é, ou simplesmente não é.

A TV é uma mídia de massas. E considerando que seu público atual (No Brasil e em boa parte do mundo) é um público médio, com acesso restrito à informação e educação, e que prefere entretenimento à instrução (E, verdade seja dita, isso não é exatamente uma coisa ruim o tempo todo), a TV tem sim que ser aberta à participação de pessoas do mesmo perfil. A TV tem que mostrar programas relevantes e que interessem o público, e isso significa colocar pessoas identificáveis na tela, mostrar produtos que possam interessar o público, fazer a plateia fazer parte de dinâmicas babacas ao invés de simplesmente apresentar o conteúdo à ela.

É uma programação ruim, rasa e recheada de informações irrelevantes, totalmente genérica para agradar (E, mais importante ainda, não atacar) o máximo de gente possível, e tem que ser assim por que por quê porquê porque senão a televisão vai à falência, tanto literal quanto figurativamente. Mídias não morrem, mas formatos sim, e a TV achou um formato confortável que dá certo, mesmo que esteja declinando há vários anos já. Vai chegar um ponto em que ou a TV se atualiza em si própria, ou acaba, e creio que para todos os envolvidos, tanto os que a fazem quanto os que a consomem, isto não seja uma opção. E se você não acredita nestas palavras porque esse tipo de previsão sempre parece idealizada, considere isto: Você realmente acha que a TV deixaria de passar um programa de qualidade, se o público, o grande público, que consome tanto o programa quanto o que ele apresenta, se interessasse? As vezes a culpa é de quem quer coisas melhores, mas não está disposto à sustentá-la.

O Ministério da Saúde adverte: Este texto é ruim igual aos programas nos quais ele se baseia.

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