Sobre depressão, RPG e ser nerd quando não era modinha

Games sexta-feira, 07 de julho de 2017

Acabei de ler o texto do Loney sobre ser um jogador de RPG sozinho e largado. Gostei do texto. Como falei pro Pizurk, gosto de textos pessoais, correlatos mas intransferíveis. Refletir-se em palavras é bacana. Tive uma urgência em expor minha visão, mas não acho que seja suficiente o espaço de um comentário, então quero partilhar minha história triste com vocês.

Jogo RPG desde os 8, 10 anos… Nessa época, tinha um garoto que mestrava usando os livros de Aventuras Fantásticas, então não tinha muita interpretação, só rolagem de dados, escolher entre duas opções e muita imaginação. Tudo muito “artesanal”, adaptado. Aventuras Fantásticas é um livro-jogo para uma pessoa, e o garoto conseguia manter três ou quatro entretidos por horas. Jogamos todos os livros da coleção dele (Pra ser sincero, eram quatro no máximo) tantas vezes que nem lembro, mas cada vez alguma coisa acontecia de diferente. Depois disso, veio D&D um de caixa azul; se eu não me engano, se chamava Classic Dungeons. Era mais um jogo de tabuleiro que um RPG, ganhava quem coletava seu objetivo pessoal em ouro.

 Rolador de dados desde pivete.

Teve também o Hero Quest. Sou tão apaixonado por esse jogo, que imprimi e montei minha própria versão. Nem parece que até ter minha própria cópia, só havia jogado umas 6 horas (Em uma única sessão), mas isso é uma outra história…

Sempre fui o nerdão da turma, sempre estive envolvido com esse mundo de fantasia e imaginação. Naquele tempo, ser nerd não era orgulho, carregar uma toalha na rua? Ia ser zoado até a morte. Não existia espaço pros nerds, eles iam pelos cantos da cidade, em bibliotecas e lojas especializadas, que nunca estavam em um local de fácil acesso. A que eu frequentava ficava em cima de uma sede do AA. Basicamente, o prédio era um ponto de encontro de viciados diferentes…

 Existe um nerd nessa imagem tentando não apanhar de alguém.

Com o passar dos anos me casei, e por isso, me separei do RPG. Ele fez falta. Eu não fazia mais nada a não ser viver uma vida de trabalhar/pagar contas/dormir. Quando eu quis voltar, o RPG estava lá pra mim. Arrumei um grupo, que são os amigos que tenho até hoje, e voltei a me sentir “normal”, mas o RPG foi sendo negligenciado aos poucos, fomos nos vendo menos, o grupo foi diminuindo e eu comecei esse caminho complicado de ficar longe do RPG novamente.

 Será que eu falhei no teste de sentir motivação?

RPG é tão nicho quanto skate: Ninguém nasce sabendo, alguns aprendem e vão, outros aprendem e ficam, e eu sou desses que ficou. Durante o boom do Storyteller no final dos anos 1990, eu estava lá, vendo toda a galerinha de preto, rolando dados ou num live action. Quando o AD&D virou 3ª edição, eu estava lá, e imprimi numa impressora matricial, em formulário contínuo, o meu primeiro resumo de regras. Foi nessa época que eu comecei a mestrar para amigos. Acho que essa foi a minha “era de ouro” do RPG, mestrar 8 horas por fim de semana, 16 quando tinha dois grupos, pra um bando de malucos que adorava se desgarrar do grupo e fazer nada, mas faziam com estilo.

 Foi de uma dessas que saiu meu primeiro livro de RPG.

Quando o RPG virou só um meio de vender mais miniaturas, eu fiquei triste por estar lá e não poder comprar. O dólar era mais barato, mas ainda não existiam compras pela internet, e as lojas cobravam um absurdo por uma miniatura.

Eu vi a Dragão Brasil surgir, crescer, morrer lentamente e ressurgir como revista virtual, com Cassaro, Trevisan e Saladino. Eu vi Marcelo Del Debbio ir de nerdão à Aleister Crawley, e a criador de boardgames, com seu novo projeto.

Quando as novas editoras surgiram no começo dessa década, dentro e fora do Brasil, com Violentina, Dungeon World, Shotgun Diaries e até o famoso Chamado de Cthulhu, eu estava lá… Senão jogando, pelo menos achando incrível esses novos sistemas sem dados, ou que tentam ao máximo simplificar as coisas, para que a diversão envolva imaginação, e não a capacidade de segurar uma enorme quantidade de dados multifacetados em uma única mão.

 YAY!! Mais 3 dessas e eu termino meu primeiro ataque!

Mas tenho que confessar, eu sou uma putinha do D&D. É isso. Assim simples. Detestei a 4ª edição, que é só uma forma de jogar MMORPG sem PC; escrevi textão por causa do escândalo da edição nacional da 5ª edição, que pra mim é umas das maiores manchas na história do RPG nacional (Ei! Eu sou da geração que conviveu com o caso de Ouro Preto). Sou desses que acha injusto e errado e não consegue ficar muito tempo calado. E estava sem jogar…

Até a semana passada, estava prestes a completar 2 anos sem rolar um dado de RPG, desde que eu conheço o dono dessa pocilga. E eu estava sem jogar, e eu estava mal… Não só com essa situação, mas comigo mesmo. Eu tinha idéias, eu tinha vontade, eu tinha mais gente com vontade, mas faltava algo, uma faísca, faltava rolar iniciativa. Foi isso que eu fiz. Como uma aventura solo para resolver um problema mental pessoal, fiz uma postagem no faceburgue, convidei amigos, implorei a alguns. E disse ao que vim: Eu quero me divertir, seja como jogador ou como mestre. Peguei as pessoas que responderam, formei um grupo e comecei a me preparar, se faziam 2 anos que não jogava, tinham uns 3~4 que não tentava mestrar. Trabalho duro, pra apresentar 4 horas de imaginação.

Eu fritei o cérebro estudando, lendo e me preparando, e quase morri louco me diverti pra caralho fazendo isso e mestrando, me senti recompensado ao falar com os novatos que estão jogando pela primeira vez comigo, contando sobre como ficaram tensos, como o clima foi criado e mantido, como eles se divertiram, e pelo fato de que já tem gente esperando alguém desistir pra poder jogar. Mas o que realmente me deixou orgulhoso, foi o RPG estar lá novamente, me jogando uma corda e me tirando do fundo do poço.

 Bring it, mofos…

No final, concordo com o Loney, ser um “jogador solteiro” é uma merda, mas às vezes cê tem que rever sua relação consigo mesmo, e tentar algo diferente. Apresentar o RPG pra gente que sempre ouviu falar, mas nunca tentou, usar gente que já joga, ou está sem jogar… Estamos às portas da web 4.0, existem inúmeros sites pra encontrar pessoas, existem campanhas inteiras rolando sem que o jogadores sequer tenham se visto pessoalmente uma única vez. De repente, a diversão está do outro lado do escudo… De repente, não é nem necessário um escudo, basta só levantar o braço no meio da multidão, ou melhor, passar os olhos pela multidão e ver a quantidade de braços levantados, esperando serem encontrados, como você estava.

Pra terminar, vou deixar as palavras de um cara que mestra quase que profissionalmente, é um bom começo…

O Gordo é um cara bem legal, pena que não pode ver mulher um dado solto na mesa. Cê quer uma tréplica pra réplica dele? Seja funcionário ou mande seu texto.

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