“Rede Globo apresenta: Havaí Cinco-0”

Televisão sexta-feira, 06 de janeiro de 2012

Assisti agora há pouco o primeiro episódio da versão moderna da série Havaí Cinco-0. Não, não tenho tevê a cabo nem baixei a série correndo da internet pra ver uma temporada inteira em um dia; assisti pela Globo mesmo. Acho que apenas esperei ela vir até mim, e veio. Como fã da série original, assisti com gosto e uma certa desconfiança, afinal, colocaram as mãos em um clássico. Por incrível que pareça, o que vi no primeiro episódio não me deixou tão descontente como achei que fosse ficar.

Foram exatos 42 anos de diferença. No dia 20 de setembro de 1968 foi ao ar o episódio piloto de Havaí Cinco-0, uma das séries de maior sucesso da televisão americana; durou doze temporadas, vendo seu final apenas em 1980 e se tornou o ponto de referência para as séries policiais e investigativas. No dia 20 de setembro de 2010, foi ao ar Havaí Cinco-0, a nova versão, que apesar de ter tido uma boa recepção do público, ainda vai precisar lutar muito pra ao menos tentar chegar perto da original.

Bem não vou falar da história da série pois estaria me repetindo. A base da nova versão da série é a mesma do original, apenas vejam no link. Diferenças mesmo são em relação a coisas mais ou menos secundárias, por exemplo: Steve McGarret, o chefe do esquadrão Cinco-Zero e personagem principal, é um ex-fuzileiro naval que vem para o Havaí atrás do cara que matou seu pai; Steve está desgostoso, irritado e mais mandão que de costume. Na versão original ele é um ex-fuzileiro e veterano da Guerra da Coréia (1950-53), que vai para o Havaí, convidado pelo governador do estado, liderar o novo esquadrão especial para combater toda sorte de meliantes, incluindo agentes da China comunista, afinal a série se passa no meio da guerra fria.

Falei isso aí pra chegar onde queria neste texto: Havaí Cinco-0 nos dá a rara oportunidade de analisar as diferenças entre o antes e o agora, entre passado e presente, e em várias esferas; conseguimos ver como a indústria de séries americana mudou, como o público mudou e, enfim, as diferenças gritantes entre a vida de 42 anos atrás e a atual. Por incrível que pareça, também podemos entrever pequenas semelhanças, afinal, ainda é o mesmo planeta. Com essa série e suas duas versões, separadas por quatro décadas, temos a chance de parar pra pensar na passagem do tempo. Não sei pra vocês, mas eu acho isso muito interessante.

Vou começar com um exemplo muito singelo. Em 1968, Steve McGarrett dirigia um Ford Mercury Marquis, modelo do ano, um enorme carro preto que cortava as ruas de Honolulu tendo o policial atrás do volante. Pois bem. Ao assistir o primeiro episódio da versão moderna, fui pego de surpresa por uma pontada de nostalgia: O McGarrett moderno chega na casa do seu recém-assassinado pai, vai até a garagem e encontra o carro que o finado estava restaurando. É, pois é. Um Mercury Marquis. E não qualquer um, foi um dos carros dirigidos pelo grande Jack Lord, quarenta anos atrás. A diferença é que antes ele era o carro do ano. Hoje ele é incompatível com o mundo, de maneira prática, digamos. É uma máquina de gastar dinheiro – pois o combustível hoje é desesperadoramente mais caro -, além de precisar de restauração, cuidados, etc.

Ao terminar o episódio e depois de mais alguns ataques de nostalgia, pude parar e pensar. Imediatamente quis fazer esse texto e já estava cheio de exemplos para falar basicamente das diferenças esporádicas que pude anotar, quando fui mais alto nas idéias. Vi tudo meio que de cima e percebi que a coisa não se limitava apenas a um carro ou roupas (No original, eram todos policiais bem alinhados, de terno, em pleno Havaí). Tudo dentro daquela nova versão nos dá pistas fortes sobre o que o público quer hoje.

Depois de quarenta anos, não se pode mais fazer uma série policial que “pense” demais. Não, não estou falando de CSI, se foi o que lhe veio na cabeça. É por que não estou me referindo a pensar com ajuda de softwares que enxergam uma face refletida numa moeda no chão do estacionamento. Estou falando de pensamento mesmo, da mente. Em 68, Havaí Cinco-0 tinha momentos que hoje seriam inaceitáveis na televisão, chatíssimos para o telespectador médio moderno, simplesmente por que ninguém estava voando por cima de um carro em chamas e sim sendo um policial. Passava-se grandes partes da trama desenvolvendo-se… A trama, porra. Alguém caçando pistas, se infiltrando em uma prisão, conversando com hippies para chegar em um traficante grande, etc. A própria ação mudou, digamos assim. Ação antes também era a tensão de cada nova pista, de estar chegando perto do meliante. Por exemplo, vejamos o primeiro episódio da série original (Não contando com o piloto), A Cinco Braças. É sobre um sujeito que seduz e mata mulheres com a ajuda de sua cúmplice, para então ficar com a herança delas. Lembro que demora quarenta minutos de episódio e muita investigação por parte da Cinco-Zero para descobrir o vagabundo, fazer uma armadilha e levar ele em cana. O primeiro episódio da nova versão tem investigação, claro. A recém-formada equipe (SPOILER) acaba por desbaratar uma quadrilha de traficantes chineses, que envolvia prostituição de meninas e tráfico de pessoas da China para as ilhas havaianas. Claro que eles fazem isso com a ajuda de escutas moderníssimas, iPhones, etc. Normal, é a evolução da tecnologia. Ah sim, e aí eles entram com um caminhão pela parede do covil do traficante. Ponto.

Como eu disse, a ação mudou. Agora o público quer ser atiçado, quer adrenalina. Ele não quer pensar muito. E se pensar, tem que ter um tiroteio no meio, pra manter a excitação. Senão, não rola. Exatamente por isso a nova Havaí Cinco-0 começa e termina com porrada. Ação, muita ação. Gente correndo, atirando, pulando por cima de carros batendo (Quando não estão batendo seus próprios), sendo ameaçada, gritando, matando. Mas enfim. A televisão reflete as pessoas, que retroalimentam a tevê; é um ciclo. E mais: É um ciclo que vai lentamente se alterando através das décadas. Quando se passa tempo o suficiente, a diferença entre o antes e o depois se torna imensa. Mas é preciso lembrar que mudanças e modernidade não significam sempre evolução, como se quer fazer crer. É isso que Havaí Cinco-0 nos permite ver.

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