O Doutrinador – Ou como manter o status quo ao tentar mudá-lo

Webcomics quarta-feira, 08 de janeiro de 2014

Se você mora no Brasil, deve se lembrar dos protestos do ano passado, aquele sentimento de indignação e etc que não durou nem um mês [Exceto no RJ, que durou um pouco mais, mas também passou]. Pois bem, apesar da galera já acostumada com protesto ter reclamado da classe média, dos boa vida, dos coxinha, da puta que pariu ter participado, aquilo acabou trazendo uma certa consciência política à população, mesmo que não seja profunda. E porque eu tou falando disso num site de entretenimento igual o Bacon? Fácil, filho da puta: Essa indignação latente fez com que O Doutrinador viesse a fazer sucesso dentre os manifestantes de sofá, ou seja, o povão do Facebook.

Antes de mais nada, acho justo deixar aqui o site pra quem não quiser ler minha lenga-lenga pseudo-intelectual/intelectualóide/opinião pessoal embasada em merda nenhuma. Se você quer só ler algo parecido com o Justiceiro, da Marvel, só que adaptado pra realidade brasileira, ou mais especificamente a política brasileira, táe. Agora, se mais do que discutir a qualidade técnica do autor, Luciano Cunha, você quer entrar na minha mente e falar sobre motivações, certas ou erradas pra gostar do material, embarque nesse carrossel comigo.

Virou uma espécie de febre a fanpage no Facebook, conforme eu já disse [Mas eu tinha que enfiar um link da fanpage do Bacon pra ver se o merchã cola, né]. Foi por onde eu inclusive conheci o personagem, não nego. E tudo porque a fanpage do Sepultura tava fazendo um anúncio de que o personagem devia usar uma camiseta de banda nacional, ao invés de Motörhead. Inicialmente não via razão pra isso, é só uma caracterização do personagem, eu pensava. Até ver essa página:

Foi ai que eu me toquei: O Doutrinador [Que é o nome que a mídia – a mídia dentro do gibi, tá confuso isso – dá pro cara, ele nunca se auto-entitulou nada] é o que vocês, jovens comunistas, chamam de “reaça”: Assim como o Justiceiro, ele tomou para si a responsabilidade de acabar com o mal. Diferente do Justiceiro, que mata tudo quanto é bandido, o Doutrinador só passa a faca em político safado. Mas a pergunta é a mesma: Ele tem esse direito? Por mais notórios que sejam os crimes de uma pessoa, é válido que alguém faça algo por conta, ao invés de utilizar os meios devidos, sendo que estes já estão corrompidos? Qual o problema em usar uma camiseta do Motörhead, se o Sepultura também canta em inglês? Tá, foi mais de uma pergunta, mas cês entenderam o cerne da ideia.

Não que eu não tenha gostado do material: Eu sempre gostei do Punisher [Justiceiro sempre me remete à velha piada da justiça feita com as próprias mãos, tão recorrente pra chamar alguém de punheteiro. Até rima], então a ideia de alguém tomando pra si, mesmo que ficticiamente, algo que todos nós, ou ao menos todos que já pensaram um pouco sobre política, é no mínimo interessante. O problema é: Não é real. E eu não tou falando isso só pelo fato de ter uma espécie de super-soldado brasileiro que se rebele e comece a passar fogo no sistema [Lembrando sempre que “sistema” é uma palavra que simplifica um negócio muito mais complexo]. Além disso, é irreal – ou surreal, escolha a que preferir – considerar que matar um, dois, vários político vá afetar todo um establishment que se encontra na sociedade brasileira. Afinal, o problema vem de dentro. E não, eu não tou falando de cocô.

Veja bem, o brasileiro adora dizer que é contra a corrupção, mas paga uma “cervejinha” pro guarda pra não levar multa. Abomina a classe política que leva comissão em tudo, mas quer levar vantagem em tudo. Fica indignado com a demora de uma obra, mas quer entrar no funcionalismo público pra não ter que trabalhar. “Ah, mas tem exceções”, claro que tem. Mas o problema é que são justamente exceções. Se fossem a regra, não estaria tudo assim. O gigante acordou. Acordou, fez uma micareta, tirou umas fotos pro feice e voltou a dormir. Espero eu que acorde mais disposto esse ano, que tem Copa do Mundo [Ótimo palco pra protestos] e eleições [Melhor do que protesto, porque você pode efetivamente fazer alguma coisa].

Antes que algum de vocês corra nos comentários e fale: AHÁ, VOCÊ É CONTRA O MOVIMENTO DEMOCRÁTICO E BLÁ BLÁ BLÁ… Não, eu não sou contra, acho muito bom que as pessoas realmente se interessem por política, que é algo complexo e tedioso ao mesmo tempo. O meu problema é com essa galera do sofátivismo, que compartilha as coisas sem nem pensar nas consequências que suas “ideias” copiadas poderiam causar, ou mesmo se aquilo é real. Trazendo um exemplo que não tem muito a ver com política: Cês devem saber da legalização da maconha para fins recreativos no estado do Colorado, lá nos EUA, certo? E mesmo tendo sido liberada muito antes, no país inteiro, no Uruguai, como os EUA olham muito mais pro próprio umbigo, o hoax que rodou foi que 37 tinham morrido de overdose de maconha no Colorado.

Sério, overdose de maconha. Teria morrido gente por fumar algo em torno de… 700kg de maconha. Eu vou deixar vocês processarem essa informação.

E, atingimos o ponto que eu queria. Esse tipo de conteúdo, por mais que seja bom pra demonstrar sua indignação ou seja lá o motivo que você usou, se foi político, tá sendo em vão. Você tá compartilhando um negócio que, além de forçado [Até ai ok, é forçado por ser fantasia], tem uma tendência política de ir com a maré. Sim, ele mata políticos corruptos. Mas quem definiu se eles são corruptos? A justiça não foi, senão eles estariam presos. Foi a população? Foi a mídia? E se foi qualquer um desses dois agentes, porque caralhos eles mesmos não botaram a mão na massa? Essa terceirização, tanto do problema quanto da solução, é o que me incomoda. Porque é muito mais fácil você se dizer injustiçado pelo sistema, ou impotente perante o mercado, do que ir atrás do que você acha certo.

Mas que o desenho é bacana e a história prende, não há como negar. A hora que sair a graphic novel eu quero.

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