A viajante

Contos sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Atenção: O conto que vocês estão prestes a ler foi baseado em uma história real – ou tão real quanto nós queremos que seja. Os nomes dos envolvidos foram alterados para resguardar suas identidades.

Se forem verdadeiros, não há explicação satisfatória para certos eventos narrados a seguir.

Parte I

Louis Clark e seu sócio, Charlie (Nomes fictícios) haviam acabado de almoçar na pequena cidade de Abbeville, sudoeste da Louisiana, sul dos Estados Unidos. Enquanto ainda conversavam sobre o trabalho, começaram a viagem para a cidade de Lafayette, a 15 milhas (24 quilômetros) de onde estavam, pela rodovia 167. Era o início da tarde de segunda-feira, 20 de outubro de 1969 e fazia um belo dia de outono, com céu limpo e a temperatura em mais ou menos 15 graus, o que permitia uma tranquila viagem com as janelas do carro abertas.

A estrada estava praticamente sem tráfego naquela hora, até que os dois sócios viram a uma certa distância mais para a frente a traseira arredondada facilmente reconhecível de um carro dos anos 30 ou 40, viajando muito devagar. Quando se aproximaram, o tema da conversa mudou do negócio de seguros para aquela relíquia que se arrastava pela rodovia. Apesar de o estilo mostrar que o carro tinha décadas de idade, ele estava em perfeitas condições, o que tirou exclamações de admiração tanto de Louis quanto Charlie. Como o carro viajava muito devagar, decidiram pela ultrapassagem, mas antes concordaram em diminuir a velocidade para admirar sua beleza e perfeitas condições. Notaram o vivo amarelo na placa, onde se lia claramente “Louisiana – 1941”, seguido de uma sequência de seis números – exatamente como que se esperaria na época, mas que ano de 1969 era provavelmente ilegal, a não ser que o dono do carro tivesse autorização especial do departamento de trânsito, como geralmente acontece com colecionadores. Parecia ser esse o caso.

Enquanto realizavam a ultrapassagem pela esquerda do antigo veículo, Louis, que estava no banco do passageiro, pôde ver que a motorista era uma jovem mulher vestindo o que pareciam roupas de época. Era 1969 e uma moça usando um chapéu, adornado com uma pena e usando um casaco de pele era, pra dizer o mínimo, estranho. Uma criança pequena estava ao seu lado no assento inteiriço, possivelmente uma menina – como usava roupas quentes, do mesmo estilo da motorista, e um gorro, era difícil definir. As janelas do carro estavam todas fechadas, apesar do clima estar confortável o suficiente. Ao emparelharem, os sócios foram alarmados pelas expressões da mulher, de medo, pânico. Dirigindo lentamente e lado a lado (A falta de tráfico contrário o permitia) eles a podiam ver olhando para frente e para trás, qual estivesse perdida ou precisando de ajuda. Ela parecia estar prestes a chorar de desespero.

Louis gritou para ela do banco do passageiro, perguntando se ela precisava de ajuda. Ela fez que sim com a cabeça, olhando para baixo (Carros antigos como aquele costumavam ser um pouco mais altos) parecendo muito confusa com o que via. O homem sinalizou para que ela fosse para o acostamento e parasse. Ele precisou repetir o pedido algumas vezes com gestos e gritos para que ela entendesse, já que as janelas ainda estavam fechadas e ela não parecia ter a idéia de abri-las. Eles a ultrapassaram quando ela finalmente começou a encostar, com a intenção de fazerem o mesmo logo em frente. Quando pararam, Louis e Charlie olharam para trás para checar a situação, se preparando para descer.

Não havia sinal do velho carro e suas ocupantes.

Os dois encararam a vazia rodovia 167 e seus arredores de mato baixo, em todas as direções, nada encontrando. Enquanto isso, um terceiro veículo parou logo atrás deles. Seu motorista desceu exigindo explicações sobre o carro antigo que viu na rodovia logo a frente. Sua história é a seguinte: Ele dirigia para o norte na rodovia quando viu, a certa distância, um carro moderno ultrapassar lentamente o antigo, tão devagar que pareciam estar parados. Ele viu os dois irem para o acostamento, com o antigo bloqueando a visão do outro rapidamente, até desaparecer no ar. Então, tudo que viu foi o carro novo parado e seus dois ocupantes saltando. Desesperado para associar alguma lógica na visão, ele imediatamente presumiu que havia ocorrido um acidente. Definitivamente não era o caso.

Depois de discutir o que cada um tinha visto, os três homens permaneceram no local por quase uma hora. O terceiro, que vinha de outra cidade, insistiu em avisar a polícia estadual. Ele concluiu que poderia ser um caso de desaparecimento e eles eram as únicas testemunhas. Louis e Charlie se recusaram a fazer aquilo, já que não faziam idéia de como explicar o acontecido às autoridades. O outro, com medo de ser ridicularizado se reportasse o que houve sozinho, desistiu que fazê-lo. Ele trocou telefones e endereços com os outros e por anos manteve contato, ligando só para falar do incidente e confirmar que tinha visto o que pensava ter visto.

Parte II

Em uma tarde fria de um sábado, 27 novembro de 1943, a estação de polícia da cidade de Abbeville, Louisiana, recebeu uma estranha visita. Era um morador local, um senhor de idade chamado Richard Perkins (Nome fictício). Perkins parecia muito nervoso e o oficial de plantão pediu a um subordinado que lhe trouxesse um copo d’água, o que foi feito. Suspeitando de que o senhor estivesse prestes a ter uma síncope, o policial que o atendeu perguntou se queria que chamasse um médico. Perkins fez que não com a cabeça, ainda que parece ter dificuldade para respirar. O policial então perguntou o que se passava, e a história contada é a que segue.

Perkins dirigia sozinho pela rodovia 167, para o norte, em direção a Lafayette. Pretendia ver o filho que morava na cidade e passar com ele e sua família o final de semana, como fazia todos os meses. No início da tarde, enquanto dirigia há pouco mais de quinze minutos, viu um carro se movendo muito devagar mais a frente. Imaginando que o motorista estivesse com problemas, pensou em perguntar se precisava de ajuda quando o alcançasse. Em um ou dois minutos, chegou ao outro carro. Dentro dele, notou que havia uma jovem mulher e ao seu lado uma criança, as duas bem vestidas. Como havia muito pouco tráfego, Perkins diminuiu a velocidade e emparelhou com o lado esquerdo do veículo, fez algum esforço para abaixar o vidro da porta do passageiro e sinalizou para a motorista, pedindo para que ela fizesse o mesmo.

A jovem parecia confusa. Olhava para o homem, aparentemente sem entender a situação. Perkins viu claramente quando a moça estendeu sua mão e a pôs sobre o peito da criança que a acompanhava, enquanto dirigia e movia os lábios, dizendo algo inaudível. Preocupado, ele tentava analisar cuidadosamente a lataria e o interior do outro carro, procurando por sinais de problemas. Enquanto olhava para o rosto em perfil da jovem, que agora parecia o ignorar e contemplar a estrada, por um instante teve a impressão de que ela saia de foco e sua figura escurecia, ao mesmo tempo.

Então, sem nenhum outro sinal, o olhar de Perkins subitamente estava focado na grama que crescia ao lado da estrada.

O homem olhou em volta, desesperado. Era um carro grande e novo, que com absoluta certeza estivera ali até dez segundos atrás. Foi como se tivesse desaparecido no ar. Muito assustado, ele imediatamente parou, desceu do veículo e olhou em todas as direções. Nada. O medo o dominava e, como ainda estava mais próximo de Abbeville do que de Lafayette, Perkins voltou ao carro, deu meia volta foi direto procurar a polícia. Fez o caminho inteiro rezando.

Ainda que suspeitando do testemunho, a polícia de Abbeville acompanhou o homem em uma viatura até o ponto em que tudo teria acontecido. Após conduzir uma busca no local e pelo resto da estrada até Lafayette, nenhum vestígio de algum acidente ou do carro e seus ocupantes foi encontrado. Seguindo a descrição de Perkins, a polícia de Lafayette foi avisada do acontecido, mas em nenhuma das duas cidades havia denúncias de desaparecimento que batessem com a descrição apresentada. Sem caso, a história de Richard Perkins foi largamente atribuída à senilidade ou pura mentira. A situação foi completamente esquecida em pouco tempo, exceto por Perkins, que confirmou o ocorrido até sua morte, em 1957.

***

Obs: A primeira parte corresponde, com leves alterações, ao contado por Ken Meaux, na revista High Strangeness 2, na primavera de 1988, que pode ser lida neste link, em inglês. A segunda parte é mera invenção deste que vos escreve, baseado na especulação que o próprio Meaux faz no final de seu texto. O autor afirma ter entrevistado Louis Clark (Ou L. C., sua iniciais reais, como Meaux o chama), e que em 88 era seu amigo há quinze anos.

Para mais contos, visite o Estranho Sem Nome. Mas não deixe ver as novidades aqui do Bacon.

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