A desvalorização da música nacional. Ou: Edu Falaschi está certo?

Música terça-feira, 15 de março de 2016

Inspirada pelo ótimo e bem antigo (Setembro de 2014, chesus) texto do Loney e pelo chilique (Bem mais antigo) do Edu Falaschi, resolvi escrever esse texto aqui sobre algo que sempre me incomodou. Concordo com ambos: O Loney disse que brasileiro acha que tudo o que é feito aqui tem que ser valorizado e ponto, sem qualquer análise crítica. O que é ridículo por si só, ninguém é obrigado a gostar de nada só porque foi feito na sua cidade/estado/país. É bom, vamo valorizar, não é bom, dane-se, não vou dizer que é só porque compartilho a mesma nacionalidade do cara que fez. Mas também concordo com o Edu quando ele diz que brasileiro paga muito pau pra gringo. Que valoriza demais o que é feito lá fora, que paga preços exorbitantes pra ver show de gringo, mas que ignora completamente quem faz metal por aqui. O que pensando no quanto o rock/metal e suas vertentes nacional é desvalorizado por aqui ele tá absolutamente certo. Parece contraditório? Parece, mas não é. Vem comigo que eu explico.

Como fã de rock, metal e suas vertentes, vagueio muito pelas internês em busca de bandas boas, que façam um som legal, que me empolguem, ou que sejam diferente do que eu tô acostumada a ouvir. Pois bem, nessas andanças descobri (E tenho certeza que bastante gente também) que banda boa não falta, seja ela nacional ou internacional. Mas algo que me chamou bastante atenção foi perceber que bandas nacionais incríveis estão no underground mais underground em comparação com porcarias que estamos cansados de ouvir e que fazem um sucesso estrondoso. Independente do estilo da banda, seja um rockabilly, que é mais comum ao ouvido, seja uma vertente mais extrema do metal, não tão digerível ao público em geral, muitas delas são praticamente desconhecidas do grande público. E por que será que isso acontece?

Acho eu que identifiquei algumas das razões, se cês tiverem mais algumas, bota ae nos comentários.

Muito headbanger – desde os ~novinhos~, com sua certeza absoluta de ‘sou o melhor, ouço o melhor, sou o máximo, sou o centro do Universo me adorem’ até os headbangers das antigas com sua ó tão certeza de que ‘o que faziam na minha época era música, isso de hoje é lixo’ – é insuportavelmente chato. Mas não qualquer chato, é daquele tipo intolerável, insuportável, intragável, que você prefere enfiar uma furadeira nos próprios ouvidos a ouvi-lo dizer e redizer (Acho que essa palavra não existe, mas ignorem) que metal bom é só aquele antigo, que ele ouvia nas fitas cassetes do Sabbath, do Led, do Deep Purple, mesmo que o infeliz tenha nascido em 1996 e faça nem ideia do que seja uma fita cassete. O cara vocifera aos quatro cantos que o rock e/ou o metal está morrendo porque não se tem bandas como antigamente mimimi blablabla whiskas sachê. Não que as bandas citadas acima não sejam boas, é claro que são (Dependendo do seu gosto, é claro). O problema é que não é só disso que o metal foi e é feito, aqui no BR ou lá fora. O problema é que o metal ou o rock não tem data de validade, e já cansei de ouvir metaleiro troozão dizendo que depois dos anos 80 nada presta. Daí já temos o problema de botar vencimento em música, que é algo que pelamor, né? Nem discuto mais esse tipo de idiotice, não tenho dinheiro pra botox pra tirar os pés de galinha, mas isso é assunto pra outra hora (Datar música, não meus pés de galinha). Mas voltando ao foco desse artigo: Nego realmente valoriza demais a gringaiada e esquece que aqui, no nosso país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza, tivemos e ainda temos bandas tão boas (Ou até mais, depende de novo do seu gosto) quanto às citadas. Não sei o que passa na cabeça desses caras e qual a relação absurda que eles fazem entre música com qualidade versus nacionalidade da banda, só sei que quando cê conversa com um deles é difícil, muito difícil, eles conhecerem bandas como Dorsal Atlântica, Hibria, Sarcófago, Ministério da Discórdia e por aí vai. E não, conhecer Sepultura não vale, até o cara que mora no Vale do Jequitinhonha conhece o Sepultura. E né, acesso a informação é o que não falta. Conheci um monte, um monte mesmo, de bandas que, quando mostro para amigos a reação é: “já sei, é aquelas bandas que só você conhece, né?” Conheço porque pesquisei, e ó, nem deu tanto trabalho assim, gente. O trabalho dessas e de outras bandas só tem visibilidade dentro do próprio círculo roqueirístico. É um trabalho pouco valorizado em vista da qualidade que apresentam. Mas voltando aos xiitinhas: A culpa das bandas nacionais não serem tão reconhecidas assim é, em parte, da mentalidade pequena dos próprios roqueiros, que não valorizam o que a gente tem de bom aqui por culpa de uma ridícula síndrome de vira-lata.

 Os caras da Dorsal Atlântica hoje em dia.

Aí é que eu concordo com o Edu, quando ele surtou com os fãs brasileiros e xingou geral (Achei um pouco exagerado, mas isso não vem ao caso): Os caras ralam pra fazer um trabalho incrível e não tem um porcento do reconhecimento que merecem. Por outro lado, pessoal paga, valoriza e endeusa músicos de fora. Não que eu ache que a gente tenha que sei lá, boicotar banda internacional, não é nada disso. Nada contra curtir essas bandas, mas custa ouvir o que a gente tem aqui também?

Outro possível culpado na minha opinião, é a cultura brasileira em si. Não adianta falar que somos um povo multicultural, que aceitamos todos e etc. Até que é verdade, mas até certo ponto. Somos sim hospitaleiros com estrangeiros (Há controvérsias a respeito disso), temos sim várias culturas inseridas na nossa. Porém, quanto à música a sociedade é bem fechada pro diferente, e convenhamos, nada mais diferente no país que é conhecido internacionalmente pelo samba e Carnaval do que um bando de gente cabeluda, de preto dos pés à cabeça, gritando a plenos pulmões algo que cê nem entende, mesmo sendo cantado em português. Claro que tou generalizando e de certa forma estereotipando os roqueiros, nem todo vocal é rasgado, nem todo roqueiro é cabeludo, mas cês tão entendendo onde quero chegar, né? O rock é em sua essência, uma contracultura, nasceu pra bater de frente com o que as pessoas aceitavam e pregavam, nasceu pra dizer o que achava da sociedade, nasceu pra discordar. É compreensível que não seja tão aceito, afinal, quem gosta de ter sua cara estapeada? Mas é interessante como num país que aceita tranquilamente mulheres dançando praticamente nuas no meio da tarde na TV aberta, a mesma sociedade não abrir oportunidades para grandes artistas por puro preconceito, por aquela velha e sem sentido história de que rock é coisa do demônio e etc etc etc. Os que conseguem chegar à fama nas grandes mídias de massa tem que se adaptar e se moldar ao que tem apelo comercial e de certa forma digerível ao público. Quer dizer, pornografia pode, música “”diferente”” não. E ó, tem banda muito boa de rock mais “calmo”, mais aceito, podemos dizer assim, que mesmo assim não tem divulgação. Quer dizer, nem é questão de não se estar acostumado com um black ou um thrash metal.

Outro ponto que pensei depois de conversar com o moço que manda aqui nessa bagaça, antes da publicação desse texto, foi que os próprios caras das bandas também tem culpa. Explico: Banda nacional, nome em inglês, letras em inglês, ce acaba nem sabendo que são brasileiros. Eu mesma já me perdi na minha biblioteca tentando lembrar se a banda era ou não nacional. Quem já caçou bandas de metal pela net tem essa experiência bem clara: 80% cantam em inglês. As bandas alegam que fazem isso por duas razões: 1. é mais difícil compor letras de metal em português, e 2. a banda alcança muito mais público quando as músicas são em inglês. Dá pra refutar as duas fácil fácil: Pode até ser mais difícil compor em português, mas não é impossível, já achei banda de power metal épica cantando em português. Preguiça não é desculpa. Quer fazer algo, faz algo cem por cento, faz com a sua identidade. E cá pra nós, algo cantado no idioma nativo tem mais vida, mais identidade, mostra quem é a banda, de onde veio. Eu pelo menos sinto mais verdade, mais emoção, quando ouço músicas internacionais em que a banda canta na língua nativa do que quando cantam em inglês. As que cantam em inglês muitas vezes parecem tão cópias, tão mais do mesmo, estereotipadas, pasteurizadas e enlatadas, sabe como é? Vou botar um exemplo aqui, não é em português, mas cês vão entender bem o que quero dizer. Lembrei dessa música e da versão em inglês logo que pensei nisso de cantar no idioma nativo. Olha só como a música tem uma força absurda em finlandês e em inglês ela é só ‘legal’, ela ainda é poderosa, mas perdeu sua essência, entendem?

Versão em finlandês:

Versão em inglês:

Quanto ao fato de alcançar mais público, faz um certo sentido e eu até concordo em parte. Inglês é basicamente a língua universal, tem alcance, tem apelo comercial. Mas também temos muitas bandas que cantam em sua própria língua e mesmo assim nós ouvimos. Quem quer ouvir música boa não se importa com o idioma. Ou seja, também não é lá uma desculpa muito válida.

Parece então que a gente vive numa eterna briga de ufanismo versus síndrome de vira-lata. Dá para conciliar os dois tranquilamente, dá pra curtir música boa e ponto, que diferença faz de onde ela vem? Que diferença faz se é dos caras do bar do centro da sua cidade ou duns barbudos esquisitos da Noruega? Prestigiar o que se faz aqui é completamente possível sem precisar desmerecer quem faz música boa lá fora e vice-versa. Mas acredito de verdade que a gente deveria valorizar muito mais o que a galera anda fazendo por aqui, não por achar que é melhor só porque é brasileiro, mas porque tem muita coisa, muita mesmo, sendo feito por aqui. Tem banda de todas as vertentes que cês imaginarem, tem pra todos os gostos, tem desde rockabilly, hardcore e punk até o doom, o trash e o death metal. Música boa, de qualidade, feita com paixão. É no final das contas, isso que importa, não?

Obs.: Botei aqui em baixo duas bandas que eu curto pra caramba. A primeira é o Hibria, que canta em inglês. Essa aí, a Nonconforming Minds, foi a primeira música deles que eu ouvi, e foi amor à primeira ouvida.

A segunda, Ministério da Discórdia, também foi amor à primeira ouvida (Gente, como eu me apaixono fácil) e um dos maiores motivos de amor foi eles cantarem em português.

Enjoy it!

Aline Freitas [Que não é a ex-funcionária] é tr00 from hell, ou como ela mesma gosta de colocar, verdadeirona do inferno. Cê também tem uma opinião que acha relevante demais pra fazer textão no Facebook? Junte-se à nós!

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