A Lição de Johnny Cash

New Emo quinta-feira, 25 de março de 2010

Olá, cinco leitores fedidos que ainda esperavam a volta da New Emo. Ela voltou, e eu vou assumir essa bagaça também, pegar a filhinha do théo e fazer o que bem entendo. Chamem-me de Harry, mas o resto não importa. Vamos agir assim, pensem que eu sou uma sombra cibernética, porra.

Johnny Cash foi um cara foda. Não existe maneira melhor de expressar a trajetória do Man in Black. Pros idiotas que acham que country é Victor e Léo, e não conhecem o mínimo do Sr. Grana (Piada estúpida digna da Praça É Nossa), Johnny Cash é a síntese do que se pode fazer com um violão, ou uma gaita, ou um revólver na mão, ou numa cela de prisão, que seja.

Sua voz estrategicamente sepulcral como de um padre numa missa enfadonha faz soar as coisas por hora melancólicas, e por hora animadas. É como aquele filme de faroeste, que não existe mocinho nem bandido, nada preto ou branco. É tudo cinza, o mundo é cinza. Seu emprego paga bem, mas você não gosta dele. Seu carro é da última geração, com um fuckin’ PS3 dentro, mas as rodas trepidam. Sua mulher é gostosa, mas ela já paquerou o vizinho. Nada nunca é bom o suficiente, mas não quer dizer que seja aquela droga de vida que os emos cantam. Ou cantavam, sei lá. Já não entendo o que é o emo hoje, né Cine? Né Restart?

Diferente de Beatles, que é uma porcaria, Johnny Cash consegue agradar a maioria das pessoas que o escutam, sem cair no temido modismo. Às vezes alguém faz um cover, uma citação, mas cê não vê garotinhas de 12 anos dando pulinhos e cantando “yeah, yeah, yeaaah!”. O Matanza fez um álbum só de cover dele. O cara tem até um filme, um dos poucos que não fizeram uma cagada com a carreira do artista. Filme bem legal, por sinal. E quem não gosta que vá pro inferno, noobs.

 Aqui procê!

Nascido no Arkansas nos idos de 1932, estava no mesmo campo dos grandes: Elves Presli (O rei do roqui, mermão!) e Jerry Adriani Lee Lewis (Aquele do topetinho, que parece possuído quando toca piano) eram figurinhas fáceis. Seu registro de nascimento atesta outro fato curioso: seus primeiros nomes são apenas iniciais, J. R. Não faça isso com seu filho, por favor. Sinta-se na pele dele, se apresentando às garotas loirinhas de 16 anos que ele vai querer pegar ao longo do 7º ano.

Cresceu num desses ranchos onde se planta pra comer, e viu a morte precoce do irmão num acidente de trabalho. Todos os elementos da sua vida serviriam de background em várias músicas, além das clássicas prisões que veremos adiante, a não ser que você seja um ex-presidiário e conheça bem algumas. Apesar de cultivar uma imagem diferente do real (Ainda falarei sobre isso com o Jimmy, do Matanza), de criminoso conhecedor da vida na cadeia, Johnny Cash nunca passou muito tempo em uma. Na maioria das vezes passava a noite por algumas contravenções envolvendo dorgas, manolo. Sabe como é, música de gaita invariavelmente lembra a vida atrás das grades.

Em certo momento conheceu June Carter, talvez o grande amor de sua vida, vai saber. E sentiu a mesma presença da luz de Deus como os Blues Brothers, e se rendeu no cristianismo de vez.

 Hello, I’m Johnny Cash. Pareço um criminoso?

Deixando o estilo professorinha de história da música de lado, vamos começar no que importa nesse post: A característica do Johnny Cash de fazer shows em cadeias, especialmente a San Quentin e Folsom, que também são temas de muitas de suas mais de 600 canções.

Você, caro leitor pseudo-extremista e pseudo-classemédiaalta, já deve ter torcido o nariz pra isso. “Ahh meu Deus ninguém faz show aqui no meu condomínio mas os vagabundos da prisão ficam com diversão grátis e agora quem poderá nos defender boom chicka boom boom boom?”

Antes que os franguinhos exaltados comecem a sacudir penas, deixa explicar uma coisa. Eu odeio bandidos tanto quanto vocês. Por mim, estupradores e comunistas (Ser commie vermelhinho é crime, viu?) deveriam ser atirados numa ilha sem árvores, pra murcharem até a morte. Então, vamos deixar esse tipo de lado, nos focar nos pequenos crimes e até aqueles maiores, tipo um traficuzinho.

O cara pra fazer show na prisão tem que ser macho. Subir no palco e tocar pros tipos mal encarados, e se acontecer algo errado, não ter pra onde fugir, a não ser pra debaixo das saias dos agentes penitenciários. Lembra daquela cena da Rita Cadillac mexendo a bunda pra uns trezentos mil negos? Pronto, imagina agora uma banda ali, tendo bandidos como platéia.

Johnny Cash fez isso lá pela década de 1960, e para alguns não pode parecer tão perigoso. Porra, desde os anos antes de Cristo que se matam pessoas e existe sujeitos perigosos. Saca só esse vídeo e vê o nível inexistente da tensão, com praticamente nada a separar os sujeitos do acontecimento – a banda e os presos:

Pode parecer injusto, pagar pena por causa de uma coisa ilícita, e sobrevier à custa dos impostos pagos por outras pessoas. Mas sabe outra coisa foda nessa atitude? É bom pra todo mundo. É como um profissional, que quando bem remunerado, trabalha melhor. Um presidiário sendo menos mal tratado, nas devidas proporções, pode mudar um pouco do seu jeito. Isso claro, em algumas realidades. Duvido que se fosse numa cadeia brasileira, as coisas andassem dessa forma.

Mas lá estou eu a percorrer terras fora da minha alçada aqui. Vamos voltar a tratar de música.

Particularmente, gosto de registros ao vivo. Não daqueles em que o puto do artista só faz o mais do mesmo do estúdio, e sim dos que tem interação com a platéia, aquela conversinha, e principalmente a conversa baixa com o segurança, pra mandar embora o cara do snake pit que jogou a merda de uma garrafa no palco, e quase acertou o baixista na cara. E cá entre nós, o melhor dos públicos que já vi foram esses idiotas presidiários. Os caras cantam juntos, assobiam, aplaudem e interagem, deixando tudo uma grande festa. E na real, é um pouco de cada um retratado naquelas músicas. E do próprio Cash também.

Nosso Man in Black não faz por menos. Lá em Folsom, um puta lugar complicado do sistema penitenciário, transborda carisma. Bebe um copo da água da prisão, ri, e outras coisas fora do script, junto com seus amigos e a esposa June Carter. Interação total, constituindo um dos melhores álbuns ao vivo de todos. Então, se você acha que o MTV Apresenta de sua bandinha preferida é o modafocá do universo, escuta esse aqui e depois conversamos. Isso sim é uma lição de como gravar, fazer uma performance ao vivo, ou ao menos sentir suas próprias músicas.

Uns aperitivos, a brilhante Cocaine Blues seguida de Como Seu Filho Deveria Usar A Música:

Não vou me ater também ao fato de existir pessoas recuperadas no sistema prisional. Correria o risco de parecer humano demais, coisa que não sou. Fantasma cibernético, lembra? Enfim, mas ainda acho que estupradores e vermelhinhos deveriam murchar debaixo do sol do Pacífico. A questão é que terminamos por nos afeiçoar tanto pelo cara, quanto pelo público. E-mail do setor de RH -> iseeproblematicpeople@hitnail.com

Talvez tenha sido uma estréia séria demais. Que merda, só percebi isso depois de terminar o texto…

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